Um dos desdobramentos mais trágicos das lutas desencadeadas a partir do processo de independência são as guerras civis. Tata-se da conseqüência mais visível e sangrenta da criação das fronteiras artificiais responsáveis pela divisão política do continente africano. Conflitos ancestrais tornaram-se guerras que desencadearam elevado índice de mortes, muitas vezes acompanhadas de golpes de Estado e instauração de ditaduras corruptas, interessadas em assegurar privilégios de minorias.
- Ruanda e Burundi - Um dos maiores exemplos dessa luta mortal entre tribos é a que envolve hútus e tútsis nos territóros hoje divididos em Ruanda e Burundi. Originalmente denominada Ruanda-Burundi, até a Primeira Guerra Mundial essa região pertencia à África Oriental Alemã. Em 1919, após a derrota dos alemães na guerra, os belgas assumiram o controle do território em questão.
Os conflitos na região, porém, remontam aos séculos XII e XV, quando chegaram ao local grupos de hútus e tútsis, qu conviveram ali durante muito tempo. Os Tútsis criavam gado, os hútus eram agricultores.
Sob o domínio belga, os tútsis, que correspondiam a cerca de 15% da população, foram escolhidos pelo poder colonial para "governar" o país. A maioria hútu (cerca de 85%) ficou excluída do processo social e econômico. Como não poderia deixar de ser, os hútus passaram a defender um governo que representasse os seus interesses. Em 1959, os agricultores hútus rebelaram-se contra a monarquia tútsi apoiada pelos belgas e abriram caminho para separar Ruanda e Burundi. Em 1961, sob a liderança hútu, Ruanda ganharia status de República, e, no ano seguinte, a Bélgica reconheceria sua independência. Perseguidos, os tútsis procuraram abrigo nos países vizinhos. Por sua vez, Burundi também se tornou independente nesse ano, sob monarquia tútsi.
Entretanto, a paz não foi alcançada. Em 1963, tútsis exilados no Burundi organizaram um exército e voltaram para Ruanda, sendo massacrados pelos hútus. Outros massacres sucederam-se até que, em 1973, um golpe de EStado levou ao poder, em Ruanda, o coronel Juvénal Habyarimana, de etnia hútu. Apesar dos conflitos persistirem, pode-se afirmar que, nas duas décadas seguintes, houve certa trégua.
Em 1993. o governo de Ruanda, lederado pelos hútus, assinou um acordo de paz com aliderança tútsi, pelo qual os refugiados poderiam voltar ao pais e participar do governo. Em abril do ano seguinte, retornando de uma conferência na Tanzânia, os presidentes hútus de Ruanada e de Burundi foram vítimas de um acidente aéreo. A morte desses líderes desencadeou a volta dos massacres.
No Burundi, apesar da condição de minoria étnica, os tútsis detinham o controle do Exército e deram um golpe de Estado em 1996, quando nomearam presidente um major dessa etnia. Além disso, obrigaram grande massa de hútus a viver na condição de refugiados nos chamados "campos de reagrupamento", que reúnem cerca de 10% da população (cerca de 800 mil pessoas), segundo dados da organização não governamental Anistia Internacional. Outros 700 mil refugiados vivem fora das fronteirs do país, mais precisamente em países limítrofes, como Tanzânia e Uganda, criando sérios problemas para os dois governos, que não têm condições de garantir ajuda humanitári a essa população.
Em Ruanda, onde a violência não tem sido menor, calcula-se que 13% da população tenha morrido na guerra desencadeada em 1994 pelos hútus, sendo 90% desse total integrantes da minoria tútsi, segundo dados da ONU.
Causas das guerras na África
A partir de 1880, a competição entre as metrópoles pelo domínio dos territórios africanos intensifica-se. A partilha da África tem início, de fato, com a Conferência de Berlim (1884), que institui normas para a ocupação, onde as potências coloniais negociaram a divisão da África, propuseram para não invadirem áreas ocupadas por outras potências. Os únicos países africanos que não foram colônias foram a Etiópia (que apenas foi brevemente invadida pela Itália, durante a Segunda Guerra Mundial) e a Libéria, que tinha sido recentemente formada por escravos libertos dos Estados Unidos da América. No início da I Guerra Mundial, 90% das terras já estavam sob domínio da Europa. A partilha é feita de maneira arbitrária, não respeitando as características étnicas e culturais de cada povo, o que contribui para muitos dos conflitos atuais no continente africano, tribos aliadas foram separadas e tribos inimigas foram unidas. No fim do século XIX, início do XX, muitos países europeus foram até a África em busca das riquezas presentes no continente. Esses países dominaram as regiões de seu interesse e entraram em acordo para dividir o continente. Porém os europeus não cuidaram com a divisão correta das tribos africanas, gerando assim muitas guerras internas.
Conflitos na África agravam a pobreza no continente
Lisboa - A África ainda sofre as consequências dos conflitos da década de 90 que impedem o seu desenvolvimento, segundo um relatório das Nações Unidas, que coloca 30 países africanos entre os 32 menos desenvolvidos do mundo.
De acordo com o relatório 2005 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), 30 dos 53 países africanos aparecem nas últimas posições a nível de Índice de Desenvolvimento Humano.
"Cerca de 40 por cento dos conflitos mundiais atuais registram-se na África e ainda que o número de conflitos esteja a diminuir, as guerras de hoje prolongam-se mais e, como tal, o seu impacto no desenvolvimento humano é grave", refere o relatório.
O documento estabelece uma relação direta entre os conflitos e a pobreza, dado que "destroem os sistemas alimentares, contribuem para a fome e a má nutrição e minam o progresso na saúde e na educação".
"Nove em cada dez países da cauda do Índice de Desenvolvimento Humano viveram conflitos violentos em algum momento da década de 90", acrescenta o relatório.
Os Estados propensos ao conflito são muitas vezes desesperadamente pobres, mas extremamente ricos em recursos e, neste caso, o relatório aponta o exemplo de Angola.
Com um balanço de um milhão de mortos ou estropiados em mais de três décadas de guerra civil, Angola utilizou "a riqueza das segundas maiores reservas de petróleo de África e das quartas maiores reservas de diamantes do mundo" para alimentar a guerra civil.
Angola aparece na posição 160, entre 177 países, no Índice de Desenvolvimento Humano e a esperança média de vida é de apenas 40 anos.
De acordo com o relatório 2005 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), 30 dos 53 países africanos aparecem nas últimas posições a nível de Índice de Desenvolvimento Humano.
"Cerca de 40 por cento dos conflitos mundiais atuais registram-se na África e ainda que o número de conflitos esteja a diminuir, as guerras de hoje prolongam-se mais e, como tal, o seu impacto no desenvolvimento humano é grave", refere o relatório.
O documento estabelece uma relação direta entre os conflitos e a pobreza, dado que "destroem os sistemas alimentares, contribuem para a fome e a má nutrição e minam o progresso na saúde e na educação".
"Nove em cada dez países da cauda do Índice de Desenvolvimento Humano viveram conflitos violentos em algum momento da década de 90", acrescenta o relatório.
Os Estados propensos ao conflito são muitas vezes desesperadamente pobres, mas extremamente ricos em recursos e, neste caso, o relatório aponta o exemplo de Angola.
Com um balanço de um milhão de mortos ou estropiados em mais de três décadas de guerra civil, Angola utilizou "a riqueza das segundas maiores reservas de petróleo de África e das quartas maiores reservas de diamantes do mundo" para alimentar a guerra civil.
Angola aparece na posição 160, entre 177 países, no Índice de Desenvolvimento Humano e a esperança média de vida é de apenas 40 anos.
Objetivos do Milênio - O PNUD considera que "prevenir e resolver conflitos e aproveitar oportunidades para a reconstrução pós-conflito aceleraria visivelmente o progresso para atingir os Objetivos do Milênio" definidos pela ONU, nomeadamente a redução da pobreza para metade até 2015.
Segundo dados das Nações Unidas, a maioria dos países da África subsaariana não conseguirá atingir estes objetivos. O relatório aponta o Sudão como exemplo da relação direta entre o conflito e o baixo Índice de Desenvolvimento Humano.
Após mais de duas décadas de guerra civil entre o norte e o sul, que provocou mais de dois milhões de mortos e quase seis milhões de deslocados, apenas uma em cada cinco crianças sudanesas frequenta a escola, cerca de um terço da população não tem saneamento básico e a taxa de mortalidade materna é das mais elevadas do mundo.
Em Darfur, região oeste do Sudão onde persiste um conflito há dois anos e meio já classificado pela ONU como a pior crise humanitária do mundo, as taxas de má nutrição estão estimadas em 40 por cento e 60 por cento das pessoas não têm acesso a água potável.
De acordo com o relatório do PNUD, os conflitos provocam a "ruptura dos sistemas alimentares, o colapso dos meios de subsistência e a desintegração de serviços básicos, já de si limitados, e cria poderosos efeitos multiplicadores, com as crianças na linha da frente das vítimas".
Dos cerca de três milhões de mortes no mundo desde 1990 relacionados com conflitos violentos, dois milhões são crianças, com a República Democrática do Congo a registrar o número mais elevado.
As consequências da guerra civil de quatro anos neste país, que terminou em 2002, continuam hoje a matar cerca de 31.000 pessoas por mês.
Segundo o documento, os conflitos têm também um impacto negativo na propagação do HIV/Aids, com a África Subsaariana a liderar a nível mundial com cerca de 26 milhões de infectados de um total de 41 milhões.
O conflito violento em países pobres é também um aspecto da insegurança global e, estima o PNUD, "a guerra contra o terror nunca será ganha, a menos que a segurança humana seja alargada e reforçada".
O PNUD considera que a ajuda internacional é essencial para a prevenção de conflitos mas lembra que esta deve ser bem direcionada sob pena de se alimentarem, ainda que não intencionalmente, conflitos internos.
Exemplo desta situação é Ruanda, "onde a assistência ao desenvolvimento beneficiou uma pequena parte da população, com exclusão da maioria, o que contribuiu para alimentar o ressentimento, para a desigualdade e para a violência estrutural".
"Se os doadores tivessem tido mais consciência das consequências dos seus atos e estivessem mais disponíveis para se envolver na prevenção do conflito, o genocídio de 1994", que provocou a morte a cerca de 800.000 pessoas em apenas 100 dias, "poderia ter sido evitado".
Comércio exterior - O relatório refere ainda que África é "cada vez mais marginalizada a nível do mercado mundial", especialmente a África subsaariana que, com uma população de 689 milhões de habitantes representa menos, a nível de exportações, do que Bélgica, com apenas 10 milhões de habitantes.
O PNUD aponta que as políticas comerciais "desequilibradas" levadas a cabo pelos países ricos impedem o crescimento dos países pobres.
"As barreiras comerciais com as quais são confrontados os países em desenvolvimento que exportam para os países ricos são, em média, três vezes mais elevadas do que as que dizem respeito às trocas comerciais entre países ricos", refere o documento.
O relatório mostra que os países pobres representam menos de um terço das importações dos países ricos mas, por outro lado, dois terços das receitas aduaneiras.
A agência da ONU dá como exemplo os subsídios que os países ricos atribuem aos agricultores, que impedem os produtores dos países em desenvolvimento de competirem em pé de igualdade, o que gera perdas anuais de 19,7 bilhões de euros.
Mega Massacre
Em 1994 os presidentes Hutus de Ruanda e de Burundi foram mortos por um míssil que atingiu o avião que viajavam. Apesar da autoria do ataque ser desconhecida, o governo ruandês identificou seu inimigo e lançou uma intensa campanha de acirramento de ódio racial que culminou em 7 de abril com a conclamação da população em dizimar seus rivais etnicos, os tutsis, e os hutus moderados que se opunham ao uso da violência. Cerca de 1 milhão de pessoas foram mortas, a maioria a golpes de facões e clavas desferidos por civis. Há indícios que os principais governos mundiais sabiam da iminência do conflito, mas não tomaram providências.
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